Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

Danos Psicológicos

Blog pessoal de Bruno Ervedosa (todas as sextas, às 22:22, um miniconto creepypasta)

Danos Psicológicos

Blog pessoal de Bruno Ervedosa (todas as sextas, às 22:22, um miniconto creepypasta)

Sonhos e Pesadelos: Coisas Sinistras em Casas Abandonadas

Quando a curiosidade nos leva longe demais

05.07.25, Bruno Ervedosa

pexels-levsi-32817247.jpg

A adolescência é uma fase marcada pela sede de aventura, a descoberta da liberdade e o impulso de ir além dos limites. No conto Coisas Sinistras em Casas Abandonadas, essa ânsia por viver algo novo leva três amigos a explorar uma quinta perdida no meio do bosque — uma decisão aparentemente inofensiva que rapidamente se transforma numa experiência arrepiante.

Resumo do conto (sem spoilers)

A narrativa acompanha Aicha, uma jovem que acaba de conquistar a liberdade de conduzir sozinha, e que, juntamente com os seus amigos Tiago e Clara, decide explorar uma casa abandonada no meio da floresta. Tudo começa como uma aventura adolescente, uma incursão típica ao mundo da “exploração urbana” — onde o desafio é entrar em locais abandonados, tirando fotos, sentindo a adrenalina do proibido e partilhando a experiência.

Contudo, a visita à tal casa revela um ambiente carregado, onde o desconforto físico e emocional vai crescendo à medida que os protagonistas descobrem que aquele espaço esconde muito mais do que paredes em ruínas e móveis antigos. O que começou como uma brincadeira transforma-se rapidamente num pesadelo inquietante e profundamente pessoal.

Este conto é um excelente exemplo do género creepypasta moderno — histórias de terror partilhadas online, frequentemente com elementos realistas e contemporâneos — e oferece uma leitura envolvente, desconcertante e emocionalmente densa.

Psicologia do medo: quando a mente entra em alerta

O conto mergulha num tipo muito específico de medo: o medo da perseguição e da invasão de privacidade. A narrativa evoca reações viscerais ligadas à ansiedade, à hipervigilância e à experiência traumática de ser observado. Estes temas estão fortemente associados à psicologia do trauma.

Aicha sente náuseas, suores frios, calafrios e sensações físicas que antecedem o terror — reações típicas de um sistema nervoso em alerta máximo, conhecido como resposta de luta ou fuga. Estes sintomas são fisiologicamente reais e surgem quando o cérebro, particularmente a amígdala, deteta sinais de perigo.

O trauma, especialmente quando está ligado à perseguição prolongada, pode levar a sintomas de transtorno de stress pós-traumático (PTSD): hipervigilância, insónias, pesadelos, flashbacks e desconfiança generalizada. A forma como a personagem lida com os acontecimentos mostra uma compreensão subtil, mas realista, da maneira como a mente humana reage à ameaça prolongada.

Criminologia e obsessão: o perfil do predador silencioso

Sob a lente da criminologia, o conto oferece pistas para compreender o comportamento de indivíduos com perfis de obsessão voyeurista, perseguição prolongada (stalking) e colecionismo patológico de memórias de vítimas — comportamentos que se situam entre a fixação e o controlo doentio.

Este tipo de predador age de forma planeada, silenciosa e invisível. São indivíduos que desenvolvem ligações unilaterais com as suas vítimas, acumulando informações, objetos pessoais e imagens, muitas vezes com uma motivação ligada à dominação simbólica ou a uma fantasia de proximidade.

A narrativa aborda subtilmente elementos de criminologia forense, sugerindo que estes comportamentos podem prolongar-se durante anos sem serem detetados, o que é consistente com casos reais de perseguição psicológica. Um dos aspetos mais inquietantes da história é justamente essa ideia: o predador já lá estava muito antes de a vítima saber da sua existência.

Exploração urbana: onde termina a curiosidade e começa o risco?

A prática da exploração urbana (urbex) é hoje popular entre jovens e criadores de conteúdo, mas levanta questões importantes de segurança, legalidade e saúde mental. Embora muitos vejam estas explorações como inofensivas, há riscos reais — não apenas estruturais ou legais, mas também psicológicos e criminais.

O conto serve como metáfora para os perigos da curiosidade cega e da normalização do risco. Também alerta para a importância de ouvir os instintos — o corpo e a mente frequentemente reagem antes de a razão compreender o perigo.

Um conto que vai além do susto

Coisas Sinistras em Casas Abandonadas não é apenas um conto de terror. É um espelho das ansiedades modernas sobre privacidade, segurança e confiança no mundo que nos rodeia. Ao unir suspense, narrativa envolvente e elementos psicológicos profundos, este conto revela-se não só assustador, mas inquietantemente plausível.

Recomenda-se a leitura com as luzes acesas — e as janelas bem fechadas.

4 comentários

Comentar post